Reconciliação - Thich Nhat Hahn


"O que podemos fazer quando magoamos alguém, que agora nos considera seu inimigo? Podem ser pessoas da nossa família, da nossa comunidade ou de outro país. Creio que você sabe a resposta. Há pouco a fazer. Para começar, é preciso aproveitar a oportunidade para dizer. “Desculpe, eu o magoei por ignorância, por falta de plena consciência, por falta de tato. Farei o possível para mudar. Não tenho coragem de lhe dizer mais nada.” 

Às vezes, não temos a intenção de magoar, mas, por sermos desligados ou por nos faltar o tato, acabamos magoando alguém. Estar alerta na vida diária é importante, para que falemos de uma forma que não fira ninguém.

O segundo passo consiste em tentar fazer brotar o que há
de melhor em nós, a nossa flor, em nos transformar. É esse o único meio de demonstrar o que acabamos de dizer. Quando formos agradáveis e joviais, a outra pessoa logo 
perceberá. Então, quando surgir a oportunidade de uma aproximação com essa pessoa, podemos nos apresentar como uma flor, e ela imediatamente notará a diferença. Talvez não seja preciso dizer nada. Só de nos ver dessa forma, ela nos aceitará e nos perdoará. É isso o que se chama de falar através da vida e não através de palavras”.

Quando começamos a perceber que o inimigo sofre, aí está o
início da compreensão. Quando virmos em nós mesmos o desejo de que o outro pare de sofrer, esse é um sinal do verdadeiro amor. Cuidado, porém. Pode acontecer de você se considerar mais forte do que realmente é. Para testar sua força real, tente procurar a outra pessoa para ouvi-la e falar com ela, e você descobrirá se a sua amorosa compaixão é verdadeira. Você precisará dessa outra pessoa para essa comprovação. Se simplesmente meditar sobre algum princípio abstrato, como por exemplo, o amor ou a compaixão, pode ser que seja apenas sua imaginação e não uma compreensão verdadeira ou um amor verdadeiro.

A reconciliação não implica pactuar com a falsidade ou com
a crueldade. 
A reconciliação se opõe a todas as formas de ambição, sem tomar partido. 
A maioria de nós tende a tomar partido em cada combate ou conflito. Distinguimos o certo do errado com base em evidências parciais ou em mexericos. 

Precisamos da indignação para poder agir, mas mesmo a indignação legítima ou justa não é suficiente. Nosso mundo não carece de pessoas dispostas a se lançarem à ação. O que precisamos é de pessoas capazes de amar, de não tomar partido, para que possam abranger toda a realidade.

Devemos continuar a praticar a plena consciência e a
reconciliação até que possamos ver como se fosse nosso o corpo de criança em pele e osso de Uganda ou da Etiópia, até que a fome e a dor nos corpos de toda a espécie sejam também nossas. Teremos, então, concretizado a não-
discriminação, o verdadeiro amor. Poderemos, assim, encarar todos os seres humanos com os olhos da compaixão e colaborar para amenizar seu sofrimento.
Thich Nhat Hanh em Paz a cada passo

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