Quem é este eu? - Pedro Kupfer



"Quando nos olhamos no espelho, aquilo que chamamos Eu parece fugir à nossa percepção. Não podemos ver o Eu com os olhos, nem tocá-lo com as mãos, nem sentí-lo com o tato ou a audição. Como é que podemos perceber o Ser? Onde ele está? Como podemos dizer que de fato existe?

Certamente, o Ser acontece no corpomente, mas evidentemente, não está limitado aos contornos do físico ou do psíquico. Não somos as experiências ou diferentes partes do corpo, ou pensamento ou as emoções, mas estamos em todas e cada uma delas.

Se isso é fato, então, encontrar o Eu dentro de uma forma limitada, restrita ao espaço do corpo físico ou do psiquismo, é um pressuposto equivocado: se Eu não tenho um limite definido, então, lutar pelo “meu” é uma equivocação.

A visão do Yoga nos mostra que o Ser é ilimitado e, portanto, não está restrito às questões do corpomente. Ao mesmo tempo em que é ilimitado, está presente em todas as manifestações da natureza, em todas as emoções, em todos os pensamentos.

Nesse sentido, ensina um texto antigo: “Aqueles que percebem a si próprios, não como corpo ou mente, mas como o Ser ilimitado, o divino princípio da existência, encontram a fonte de toda felicidade e residem nela”.

O Yoga propõe então uma mudança de visão. Todos temos uma perspectiva sobre as coisas, sobre nós mesmos e sobre a vida. Cada um tem um olhar diferente. Numa praia, por exemplo, olhe para as pessoas.

Cada uma, com sua atenção seletiva, está atenta a uma parte diferente da paisagem e dos acontecimentos: os surfistas olham para as ondas, apreciam os ventos e as correntes, mas não dão a mínima para os peixes, que atraem toda a atenção dos pescadores.

As mães não olham para as ondas nem para os peixes, mas para seus filhos brincando na beira do mar. As crianças, por sua vez, estão totalmente absorvidas em seus castelos de areia.

Se quisermos que a nossa vida seja digna de ser vivida com plenitude e felicidade real, é fundamental cultivar uma atitude de aceitação de cada pessoa como é, cada uma preocupada na sua satisfação pessoal, em prover suas necessidades básicas.

Nessa ordem de coisas, é desejável aceitarmos com gratidão aquilo que a vida nos oferece agora, sem nos preocupar com como deveriam ser as coisas, e aceitando tudo e todos como presentes que a vida nos entrega para o benefício de todos.

Qualquer coisa que seja, é evidente para nós. Aquilo que os olhos vêem se torna evidente. Você é, logo você brilha. Brilha e ilumina os objetos à sua volta. Você não precisa ser iluminado por outra consciência para ser, e saber que é. Você é autoevidente. Sua existência é autoevidente. A consciência é a única que brilha por si mesma.

Os diferentes objetos na criação se tornam evidentes para você através de cinco meios de conhecimento, pelos quais você pode dizer que as coisas são, que as coisas existem. Esses cinco meios de conhecimento são os seguintes: 1) percepção, 2) inferência, 3) inferência complexa, 4) constatação da ausência e 5) ilustração.

Ainda quando dizemos "isto foi" para nos referir a algum evento do passado, fazemos isso no presente, desde o presente. Você diz que está com fome, sede, você tem emoções, experiências, conhecimento e ignorância sobre as coisas.

Tudo se torna evidente para si. Você é a testemunha que percebe as coisas. Portanto, não pode dizer que algo exista sem apelar para um desses meios de conhecimento.

Agora, você existe ou não? Através de qual desses meios de conhecimento é que você pode dizer que existe? Qual deles você usa para afirmar que você é? “Eu devo existir, pois penso que ninguém ia casar com uma pessoa inexistente”.

Quando você diz “eu sou”, não precisa de nenhum meio de conhecimento para afirmar isso. Você não precisa provar a sua existência. A existência é o significado da palavra Eu.

O corpo se torna evidente para si. A mente se torna evidente para si. Portanto, este Eu que você é, é autoevidente. E este Eu é, sempre foi e sempre será, livre e pleno. 

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