Do ponto de vista do Iluminado - Ramesh


"Participante : Como o organismo corpo-mente que alcançou a iluminação vê o mundo? O que ele vê? O que significa quando ele descreve o mundo como sendo irreal?

Ramesh :  Shankara descreve o mundo fenomênico como irreal, por isso, ele foi tido como ateu. O contexto no qual ele diz que o mundo é "irreal", é o ponto que leva ao mal-entendido. 
Quando ele descreve o fenomênico como "irreal", ele quer dizer que se assemelha a uma sombra, que não pode existir sem o objeto, cuja qual está projetada. A sombra depende da existência do seu objeto. Não tem existência independente. Neste sentido, o mundo é um fenômeno irreal, é um reflexo do numênico.

Em outras palavras, subjetividade ou numênico, transcende a manifestação fenomênica. 
O Absoluto e o manifesto não são dois. Esta identificação entre o Não-manifesto e o manifesto é um dos pontos que leva ao mal entendido. 
Não há dúvida em se identificar com o mundo. Se você pergunta, " Existe identificação com o mundo?" existe aqui uma dualidade; 

A compreensão seria: Tudo é Consciência, que manifesta a si mesma como a manifestação total, na qual surpreendentemente existem objetos, com uma surpreendente variedade de divergências, com uma surpreendente variedade de individualidades. Eu lhes digo que, essa imensa variedade não são só as impressões digitais, as vozes, os batimentos cardíacos de um indivíduo, que podem até ser identificados por máquinas sensíveis. Mesmo assim, com essa diversidade imensa, ainda assim existe a unidade na diversidade. 

A Unidade que funciona como a Totalidade, elementos subjetivos são comuns a todos os seres sencientes. 
A compreensão remove a separação. A multiplicidade é reconhecida como sendo apenas na superfície.

Participante : Quem é você?

Ramesh : Eu sou Consciência e você também é. E Consciência é que constitui e funciona através de cada organismo corpo-mente, cada ser senciente, não importando que seja um ser humano ou mesmo um inseto.

Participante: Para os que ainda não passamos por essa mudança, qual seria o conceito que surgem em sua mente, quando o assunto é Iluminação da Consciência?

Ramesh: Não. Veja bem, iluminação significa o fim de todos os conceitos. Todas as dúvidas cessam. Não existe mais nenhuma dúvida, nenhum conceito. Não se precisa mais de conceitos. 
Conceitos e dúvidas só podem existir quando o "eu" está presente. Na mente dividida entre sujeito e objeto, ou lógica e razão; na mente pensante do "eu" existe uma coleção de dúvidas. 
Quando este "eu" se vai, quem tem dúvidas? 

Isso que estou dizendo hoje, eu não pensei e nunca havia dito assim antes. Isso apenas acontece. A resposta não está pronta. Quando a questão é colocada, a resposta aparece. Elas não são formuladas. Não existe nenhuma mente interpretando e pensando sobre as respostas.

Participante: Então, você vive naturalmente e espontaneamente todo o tempo?

Ramesh: De fato, vivo de modo natural e espontâneo. 
As pessoas em geral, acreditam que são os verdadeiros agentes da ação, e depois se sentem responsáveis. Elas acreditam que podem mudar o mundo. Eventualmente creem que podem controlar os pensamentos, e os eventos; controle este que realmente nunca existiu. 
No processo da compreensão, o indivíduo passa por muitas dificuldades e mudanças, as quais ele chama de infelicidade. Nesses períodos de infelicidade, ao invés de perceber que as coisas acontecem espontaneamente por si mesmas, e isso mudaria toda a base de suas vidas, ele pensa que para ser feliz, deve melhorar a si mesmo. 
Com isso, ele vai fazendo uma série de cursos de auto-aprimoramento, e obtém somente resultados limitados, e mais frustração se segue.

Participante: Então, você acredita que você não se têm controle sobre como a vida será?

Ramesh: Eventos que acontecem através de qualquer mecanismo corpo-mente, estão sempre além do controle da entidade separada. 
Mas, a maioria das pessoas não realiza isso. 
Elas estão acostumadas a acreditar que elas estão fazendo escolhas. Elas acreditam que tem escolha e decisão sobre as ações, e mesmo assim continuam se sentindo extremamente infelizes.

Iluminação simplesmente significa que tudo está sendo realizado. 

Então, ao invés de estar envolvido em qualquer ação que ocorre, não apenas com respeito ao organismo corpo-mente, mas também através daqueles que encontra, existe uma aceitação de todas as ações como parte do funcionamento da Totalidade. 
Tudo o que muda é a atitude, a perspectiva, a compreensão. 
O mundo continua e continuará do mesmo jeito.

O resultado da iluminação acontece de vários modos. A maneira espontânea de se viver, é descrita por Lao Tzu de maneira muito bela. 

A propósito, Maharaj ( Nisargadatta Maharaj) nunca ouviu falar de Lao Tzu. Ele nunca ouviu falar de Lao Tzu ou do Taoísmo. Mas é absolutamente incrível, como são paralelos os ensinamentos destes dois. 
Eles tem que ser, porque o tipo de vida que começa após a iluminação, seja na China há dois mil anos atrás, ou a de Ramana Maharshi há cem anos atrás, tem que ser a mesma. Quando você lê Lao Tzu, você é golpeado com uma grande admiração. 

Mararaj vivia em um pequeno distrito de luzes vermelhas em Bombaim, dentro de uma casa de pedras. E Lao Tzu vivia nas montanhas da China, ambos com atitudes de vida idênticas; atitudes essas que trazem uma espécie de brilho que afeta todos aqueles que entram em contato com eles.

A vida de um sábio é uma vida corajosa, pelo olhar da maioria das pessoas. 

O que quero dizer por "vida corajosa" é viver não em confronto com a vida, mas em total aceitação, essa mudança é a base da vida. 

Viver a vida corajosamente significa reconciliar educação com compreensão, unidade e diversidade, ordem e espontaneidade, sociabilidade e individualidade. A variedade de experiência e percepção é vista como a maravilhosa diversidade, acontecendo na unidade. 

O sábio não harmoniza disciplina com compreensão, ou combina ordem com espontaneidade. Isso apenas acontece, e aí reside a magia e a maravilha de tudo isso.

Uma vida corajosa só não acontece para pessoas comuns, porque elas continuam dizendo: "Eu preciso me aprimorar". E quando acontece de interagir com outras pessoas, as liberdades são postas à prova, e o conflito aparece. "Ele quer ser individual"; diz Eu quero viver minha própria vida. Eu quero ter minha vida particular, minha dieta, meus exercícios. Eu quero viver por mim mesmo.
Mas, na vida você não pode ser um recluso; você tem que viver com os outros. Quando a individualidade entra em choque com as outras individualidades, os opostos se chocam e o conflito acontece, e isso gera angústia.

Mas, quando se compreende que ambos funcionam espontaneamente juntos, então automaticamente existe uma reconciliação e uma unidade entre eles.

Uma vida corajosa não significa confronto com a natureza, mas uma alegre cooperação, com os princípios de funcionamento da natureza. 
Na maneira de se viver atual, a consciência iluminada assume a forma de participação voluntária nos eventos que acontecem a cada momento, sem fórmulas ou conceitos; tudo acontece de forma natural e espontânea. 
Existe a profunda convicção "Pai seja feita a Vossa vontade, não a minha.

Esta atitude necessita de uma ausência espontânea do agente pessoal (eu) em seja qual for a atividade. Esta forma de viver se torna naturalmente virtuosa, não no sentido deliberado de exercício moral ou de retidão. 

Participante: Sua iluminação, lhe trouxe o propósito de ensinar? Existem outras iluminações que trazem o propósito de curar? 

Ramesh - Sim, claro. A iluminação acontece, o que irá acontecer com o mecanismo corpo-mente após isso é impossível de se dizer. Não existem regras. Pode não acontecer nada ao organismo corpo-mente, e tudo continuar exatamente como antes, ou algo pode mudar. 
Alguns que nunca escreveram começam a escrever. Outros que temiam falar em público após o jantar, começam a dar palestras. É uma espécie de milagre!

Participante: Fico encantado como as palavras apenas fluem

Ramesh: Dizer apenas fluem, é correto. O mesmo é verdadeiro para os livros que são escritos, as palavras apenas fluem."
Ramesh Balsekar em Counsciousness Speaks

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